domingo, 22 de novembro de 2015

Expectativas amazonenses para a COP 21

* Ecio Rodrigues
No Amazonas, a classe política, de forma preponderante e inusitada, acredita enfaticamente no grande equívoco de que a Zona Franca de Manaus funciona como freio para o desmatamento. Tal convicção se escuda nas baixas taxas anuais de desmatamento observadas naquele estado, que deixam os amazonenses bem distantes dos elevados índices exibidos pelos paraenses, seus competidores diretos pelo domínio econômico regional.
Trata-se de um grande equívoco, porque a atividade produtiva desenvolvida no âmbito do modelo de Zona Franca, caracterizada, nesse caso, pela presença de montadoras de artigos como eletroeletrônicos e veículos de duas rodas, não tem qualquer tipo de interferência sobre a taxa de desmatamento.
Com efeito, não seria sensato supor que um setor industrial cujos artefatos são produzidos em unidades fabris instaladas na região Sudeste e apenas montados em Manaus (no intuito exclusivo de obter benefícios fiscais) seja capaz de intervir no processo de ocupação produtiva desencadeado no meio rural amazonense.
Insensatez ou não, esse pseudoargumento, que as montadoras da Zona Franca de Manaus refreiam o desmatamento, foi largamente utilizado – com sucesso, aliás – para convencer os parlamentares em Brasília a prorrogar os benefícios fiscais inerentes à Zona Franca até 2073. Um disparate, claro.
Muito provavelmente, as reduzidas taxas de desmatamento medidas no Amazonas estão relacionadas, em primeiro lugar, à gigantesca superfície territorial desse estado, que alcança 157,07 milhões de hectares – a maior do país.
Em segundo lugar, também tem grande influência a localização geográfica do Amazonas.  Além de se distanciar da frente de expansão agropecuária representada pelo Arco do Desmatamento, o território amazonense não possui ligação rodoviária com o restante do país. Essa condição, é bom ressalvar, poderá ser fortemente alterada com a conclusão da rodovia BR 319, que vai de Manaus a Porto Velho, em Rondônia.
Não à toa a área desmatada se concentra nas porções sul e sudeste do estado, mais próximas e com acesso ao Arco do Desmatamento. Por sinal, o maior rebanho estadual pertence ao Município de Boca do Acre, que faz divisa com o Acre e é ligado a este por estrada.
A pecuária é a atividade com maior taxa de crescimento e a principal responsável pela ampliação do desmatamento. Por outro lado, as Reservas Extrativistas, que podem funcionar como alternativa ao modelo colonizador assentado na criação de gado, integram uma parcela de terra considerável, totalizando 3,51 milhões de hectares, de acordo com o censo agropecuário de 2006.
Diante dessa realidade, é razoável prever que, dos estados amazônicos, o Amazonas pode ser o mais impactado pelos resultados da COP 21, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que acontecerá em Paris, França, em dezembro próximo.
Diferentemente do que ocorre com os vizinhos Rondônia e Pará, o Amazonas não tem consolidada a opção pelo agronegócio, ao tempo em que possui expressiva área destinada às Reservas Extrativistas e à mata ciliar. Desse modo, o estado tem a chance se firmar como exemplo de projeto de economia de baixo carbono – o que seria inédito na região.
Experiências já realizadas, sob tímida alocação de recursos até o momento, como o Centro de Biotecnologia da Amazônia, a Bolsa Verde e assim por diante, poderão receber apoios expressivos de outros países, de forma a adequar o processo de ocupação produtiva levado a cabo pelos amazonenses aos padrões de sustentabilidade mundialmente requeridos.
Ainda que os políticos queiram atrelar o futuro do estado à existência da Zona Franca, o Amazonas poderá traçar um caminho bem diferente. É esperar para ver!  


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

domingo, 15 de novembro de 2015

Expectativas acreanas para a COP 21

* Ecio Rodrigues
Durante toda a década de 1990 e um pedaço da seguinte, o Acre gozou do status de bom exemplo quando o assunto era o desmatamento na Amazônia. Ostentando taxas quase sempre inferiores às demais localidades amazônicas, o estado se orgulhava de sua reputação ambientalista.
Mas, como costuma acontecer com tudo o que é frágil, com toda conjuntura que não decorre de diretrizes inequívocas e políticas bem resolvidas, essa situação em muito se alterou.
Sem tentar estabelecer o ano, ou o momento histórico, como gostam os historiadores, em que a ação estatal para contenção do desmatamento descarrilhou, o fato é que as estatísticas de desmatamento no Acre assustam o governo federal e os ambientalistas – que, aliás, sempre foram aliados de plantão.
Os números atuais sobre a dinâmica do desmatamento na Amazônia apontam que dois municípios do Acre figuram entre os dez que mais desmatam na região.
Foi assim em 2014, e tudo indica que continuará assim em relação ao período que vai de agosto de 2014 a julho de 2015, cujo diagnóstico o Inpe deve publicar nas próximas semanas.
Por sinal, existe a possibilidade de o relatório sobre o desmatamento trazer números vexaminosos justamente no momento em que a comitiva de autoridades públicas estaduais arruma as malas para ir a Paris prestigiar a COP 21.
Acontece que, bem diferente do ambientalista de outrora, o Acre de agora deverá reconhecer o esgotamento do discurso de sustentabilidade, que tanto ajudou a eleger seus políticos.
Tudo indica que o propósito de estabelecer o diferencial de uma sociedade que respeita o meio ambiente e valoriza a floresta se perdeu, diante da ausência de investimentos estatais que transformassem em realidade o que era repetido nos palanques eleitorais.
Ao que parece, é preciso muito mais vontade e competência que discursos e preleções para se alcançar uma saída que forneça trabalho e renda por meio da criação de um Cluster Florestal – vale dizer, um sistema de produção baseado na exploração da biodiversidade presente no ecossistema florestal, compreendendo um aglomerado de empresas do setor primário, secundário e terciário e com escala de produção pequena, média e grande.
Talvez o fato mais emblemático dessa triste mudança de rumo, que reflete uma realidade que desmascara a continuidade da pregação de que o Acre é sustentável, tenha sido a extinção da Secretaria de Florestas.
Na condição de espaço estatal para discussão e aperfeiçoamento de um setor que abrange desde o seringueiro ao industrial da madeira, a lacuna deixada pela Secretaria de Florestas não foi preenchida e não há perspectiva para a condução da política estadual destinada à produção florestal.
Aos extrativistas, que se encontravam em processo de mobilidade social para atingir o patamar de manejadores florestais, resta a opção pela pecuária, setor para o qual o apoio estatal nunca deixou e nunca deixará de chegar.
Aos industriais da madeira – uma vez que o setor industrial, inclusive aquele vinculado à construção civil, não representa, e não representará no médio prazo, alternativa de investimento no Acre – resta ouvir o gerente do Basa, que há 30 anos vem repetindo: é melhor investir na pecuária.
Aos gestores do Acre presentes na COP 21 resta pouca coisa a oferecer – e, inevitavelmente, muito a explicar.

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.